Atitudes equivocadas cometidas no dia-a-dia da produção musical por todos nós, artistas, produtores, instrumentistas, arranjadores, operadores de áudio, técnicos, empresários ou tudo isto junto, às vezes são pecados capitais.
Soberba, orgulho excessivo, arrogância, vaidade (o mais grave). Quando um artista busca um produtor para realizar o seu projeto, ele quer alguém que entenda a sua arte, que saiba ouvi-lo, que seja capaz de sentir o que ele sente. Ele precisa de apoio, incentivo e, principalmente, de alguém que organize suas idéias e saiba dar valor a elas.
O produtor musical vaidoso, orgulhoso, quer usar o projeto musical do seu cliente para aplicar as suas idéias. Ele despreza a arte do outro para, de carona, fazer a sua própria arte. Sempre desvirtuando os objetivos e o estilo do artista, pode até ser muito criativo, mas, na maioria das vezes, cria um pastiche ou um Frankenstein.

A soberba, muitas vezes, esconde uma grande insegurança.
A insegurança mal-disfarçada do técnico que se intitula engenheiro ou do arranjador ou regente que faz questão de ostentar o título antiquado de maestro.
A humildade faz o grande produtor. Ele sabe a tarefa que tem pela frente: ajudar o artista a realizar o seu trabalho, garantindo toda a estrutura material, intelectual e emocional para pegar a pedra bruta que seu cliente lhe trouxe e lapidar a jóia que os dois estão desenvolvendo. E que, para isso, precisa estudar sempre. A arrogância, no estúdio, aniquila um bom trabalho.
Avareza, ganância. Levar vantagem em tudo. Esta é a maneira mais rápida do avarento esvaziar o seu estúdio. Cobra caro, com pagamento à vista, aluga para o cliente cada periférico que ele mesmo indicar. Se der, vende para o coitado aquele equipamento obsoleto ou o outro que veio do conserto, mas que vai quebrar de novo a qualquer momento. Faz o cliente gastar mais dinheiro do que o combinado. Quando o computador trava, continua cobrando a hora do estúdio, sem descontos nem compensações. Se parcelar o pagamento, telefona para cobrar com aquela voz ameaçadora.
A generosidade nos faz acrescentar novos elementos à produção. Dividindo nossos sentimentos, compartilhando opiniões e buscando o entendimento, superamos o erro e somos mais criativos.
A avareza de um cliente também pode inviabilizar um belo trabalho. Para que os dois ganhem sempre, é preciso expor todos os argumentos com clareza.
Luxúria. O ambiente do estúdio é muito propício para o clima festivo que encontramos, por exemplo, nos camarins dos shows. Só que no camarim, o show já terminou, enquanto que, no estúdio, a festa impede a continuidade, a fluidez do trabalho criativo. O ambiente lúdico, divertido, agradável é essencial durante a produção, mas é bom não confundirmos as coisas nem misturarmos o âmbito pessoal com o profissional.

Inveja, cobiça, ciúme. Ao desejarmos instrumentos, equipamentos, programas e salas acústicas que encontramos em estúdios, ou a criatividade e o conhecimento de outras pessoas, geralmente nos esquecemos de experimentar mais a fundo aqueles recursos de que já dispomos. Tirar água das pedras pode ter um incrível sabor.
Produzir música é uma profissão deliciosa. Mas cuidado com a zica, os seca-pimenteiras estão por aí.
Ira. São freqüentes os erros e acidentes inesperados no estúdio, por melhor que seja o planejamento. É importante saber lidar com isto. Um produtor autoritário, raivoso, irritado, agressivo, grosseiro, impaciente, irado, descontrolado ou agindo com irracionalidade pode desestabilizar e inviabilizar muitos projetos. Evitamos arrependimentos trabalhando com a razão enquanto administramos a emoção para mantê-la criativa, nunca destrutiva.
A paciência é uma das principais características do bom produtor musical.

Gula. Primeiro o camarada pega o telefone e pede pizza, cheeseburger, filé, cerveja, refrigerante e não sai do estúdio. Quando finalmente se levanta da cadeira chegam a artrose, a escoliose, a lordose, a hérnia de disco. Ah, e o colesterol. Nosso corpo é um instrumento que precisa ser afinado regularmente para funcionar bem. E para que a mente funcione bem. A temperança é a virtude de assegurar o domínio da vontade sobre os instintos, proporcionando equilíbrio.
Já o cardápio do artista é sagrado. Alguns dos maiores produtores do mundo enchem o frigobar do estúdio com todos os acepipes favoritos do seu cliente. E vão pessoalmente ao supermercado. O artista precisa se sentir em casa no estúdio.
Preguiça, negligência, desleixo, lentidão. Hoje, é impressionante a quantidade de produtores musicais que não se interessam em aprender música. Acreditam piamente que a tecnologia pode substituir todo o conhecimento musical acumulado pela humanidade. Ao negligenciar o seu desenvolvimento intelectual e artístico, o candidato a produtor pode estar sendo vítima da preguiça, o pior dos pecados. Afinal, dominar os recursos tecnológicos é bem menos trabalhoso e demorado do que estudar música.
Estudar música exige disciplina, persistência, hábitos rígidos, atividades repetitivas e, muitas vezes, maçantes, dedicação e disponibilidade. Leva anos para tocarmos razoavelmente um instrumento. Mas são essas práticas que desenvolvem o nosso ouvido, a criatividade, a rapidez em encontrar soluções, a atenção aos detalhes.

O produtor musical completo conhece música e domina as ferramentas tecnológicas. Ele pode atuar em qualquer função no estúdio, como técnico, instrumentista, vocalista ou arranjador. Por isso, tem o controle do processo. Se ele souber menos que o seu cliente, como poderá ajudá-lo? Vai gravar o violão desafinado e tentar salvar com o Melodyne? Ou vai programar música eletrônica sem saber música? Todos os bons produtores são bons músicos e bons técnicos.
É muito fácil falar em dom. Dom, inspiração, essa parte é só um por cento do trabalho. Os outros 99% vêm da diligência, da iniciativa, do estudo, do capricho, do esmero, do empenho, de planejarmos e desenvolvermos uma carreira profissional com todos os seus riscos e todo o seu esforço.
Por falar em esforço, planeje e cumpra sempre os prazos de conclusão dos trabalhos, levando em conta todas as etapas e os imprevistos.
Esses são alguns pecados, os capitais. Com certeza, cometemos outros. Espero que ninguém tenha se ofendido. Quem nunca pecou, atire a primeira pedra.
- Artigo gentilmente cedido por SERGIO IZECKSOHN
- Para ler este e outros artigos na fonte original acesse: http://homestudio.com.br/blog/



